Vim contar o que aprendi ao escrever o artigo anterior, durante minha primeira crise não verbal consciente.
Por causa da instabilidade da minha mente Autista, criei algumas estratégias para não ficar sem conteúdo no blog. Aproveito os momentos que estou bem e anoto muitos textos e frases que surgem na mente. Tenho ideias até de mais, então escrevo todas que puder. Nos momentos mais aleatórios, eu paro e anoto algo no celular, no notebook, ou onde der. Tem que ser antes de esquecer, pois o pensamento logo viaja. O triste, é que as vezes acabo com vários artigos perdidos, em pedacinhos abandonados pelo tempo.
Quando me vi no começo dessa crise não verbal, sem ainda entender o que era, eu me cobrei ação. Como a gente sempre se culpa quando está mal, não quis desistir de escrever. Pensei que escrever algo motivacional, poderia ajudar a mim mesma durante essa fase, mas não foi bem assim.
Na tentativa de me sentir útil, peguei minhas anotações e comecei a editar o artigo. Em vários momentos, meu cérebro se recusou a trabalhar. Ao perceber aquela dificuldade estranha, a Centelha me intuiu que eu estava em crise não verbal. Senti que mostrar essa parte humana também era importante e útil. Depois de me respeitar, o cérebro voltou a colaborar.
Tudo Bem ter Limites - Reconstruindo Bordas
Aprendi, que nesses momentos meu cérebro precisa de respeito, e não de motivação. Não adianta forçar a barra, isso não é positivo nem gentil comigo. Tudo bem cansar, se eu sei que dei o máximo de mim.
Lembrei agora, que uma vez fui demitida e humilhada na frente dos outros, por simplesmente falar que estava dando meu máximo em agilidade. Falei porque era verdade, sem segundas intenções. Gente, e esse máximo não foi pouco não. Eu estava indo bem, me davam os trabalhos mais difíceis, e eu até levava pra casa.
Quando fui pegar as contas, ainda falaram para eu aprender com o meu erro. Essas pessoas me fizeram acreditar, que era eu quem precisava aprender. Hoje isso já não dói tanto. Porque, a culpa que eu me colocava nessas situações, era bem maior que qualquer rancor. Tinha a culpa por falar "o que não devia", a culpa por não me encaixar. Anos depois, quando entendi o ocorrido, e devia ter me recuperado, veio a culpa por não me defender. É muito triste não conseguir ter um esforço genuíno reconhecido. Então, também tinha a culpa por não conseguir perdoar. Eu sempre me botando em último lugar, percebe? A gente vira um caquinho, e depois tem que catar os pedacinhos e juntar.
Valeu a pena, eu venci.
Hoje, vejo o quanto tudo isso me deixou forte, e me fez procurar Deus. Então,
no fundo estava tudo do jeitinho que tinha que ser. Prefiro sofrer e ter Deus,
do que fazer os outros sofrerem, e ficar distante do Amor que Deus é. Isso é
transmutação de energias densas. Tudo experiência, pra gente observar o que
não é, e se encontrar. Deu tudo certo, eu não me corrompi. Machuquei a mim,
mas me perdoar por isso é mais acessível. Pior seria, voltar pro Todo, e
descobrir que machuquei muito alguém. Eu iria sentir toda a dor desse alguém,
pois somos um. Precisaria voltar para aprender mais. Então, observando pelo
karma, não sou bem eu a vítima. Eu venci. Que lindo isso.
A Disfunção Executiva do TEA
Voltando a experiência da escrita. Foi estranho, pois precisei editar o artigo
muitas e muitas vezes. Muitas mesmo, um montão. Quando
eu estava funcional, escrevi tudo em minutos. Durante a disfunção executiva,
levei uma semana para juntar as peças e tirar o texto do rascunho.
Vi que em vários momentos, não encontrava a combinação de palavras certas para algo simples que queria expressar. Levei três dias para conseguir editar um único parágrafo, que estava confuso. No fim, era apenas uma alteraçãozinha que faltava, mas eu não tinha o raciocínio na hora que queria. É como gastar muito mais energia pra uma coisa que devia ser básica.
Esse artigo "Como iluminar nossos caminhos sombrios", foi feito de partes escritas quando eu estava bem, remendadas com pedacinhos em crise não verbal curta (Shutdown), e editado durante uma crise executiva longa (Burnout). Como muitos outros, mas esse é especial, já que foi consciente do meu momento internalizado. É eu sabendo que estou tentando me sentir útil e me animar, em um momento que preferia só dormir, ou ficar no escuro em silêncio.
Um Tédio Bem Estranho.
Eu tentei, mas o artigo não me trouxe aquele ânimo que senti dias atrás, no momento que anotei algumas partes no rascunho. É como se aquelas mesmas palavras não tivessem mais todo o significado que tinham antes. Como se a mente não processasse a profundidade do que estava sendo escrito. Mesmo acreditando no que estava ali no rascunho e no que queria transmitir, eu me sentia meio distante, sem participar daquilo. Pois, era um texto bem complexo de assimilar. Senti, como se a escrita tivesse sido iniciada por outra Camilla mais intelectual.
Nesses momentos, nem assistir meus Doramas parece tão legal como em outros dias. Parece que não sinto o contexto, e não tenho uma imersão da mesma forma que antes. Mesmo assim, eu tento fazer algo tranquilo, para o tempo passar logo. Já entendi, que é melhor ficar quietinha mesmo, vendo uma série fácil de assimilar.
Não é Preguiça, é Necessidade.
Até me aventurei em uma faxina leve, pois no início pensei que podia ser a energia do ambiente. Mas como eu canso... É tipo obrigar o corpo a fazer algo que ele não consegue. Os sintomas variam. Pode vir uma fraqueza e cansaço fora do normal. Outros dias o corpo fica com uma rigidez muscular e qualquer esforço machuca. As vezes vem até uma sensação de febre, outras dá enjoo. Nosso corpo arruma qualquer jeito de parar a gente.
Quando eu era adolescente e não sabia ser autista, as vezes dormia por 15 e até 20 horas diretas. Além de tudo, ainda escondia e me culpava. Pois aprendi, que dormir demais era preguiça. Quantos aniversários e compromissos já faltei por causa de crises, e ainda fiquei parecendo mentirosa. Porque, a outra Camilla com bateria social, é a que saí de casa e todo mundo conhece mais.
O Espectro do meu Autismo.
Consigo me expressar assim em meio a crise, pois escrever é bem mais fácil que verbalizar falando. E também por eu estar aqui, falando comigo mesma. Eu posso editar esse post quantas vezes achar necessário.
*Voltei aqui depois da crise e editei bastante o texto todo. Aproveitei a volta do foco para desabafar um pouco mais e compartilhar meus aprendizados.
Conversar comigo assim até me ajuda, é praticamente como uma terapia. A demanda energética é bem diferente de um texto complexo e intelectual. Ou de falar com alguém específico, que vai me responder e interagir. Com medo do desgaste, ao se deparar com a necessidade interação, a mente acelera, faz uma previsão da conversa e entra em colapso.
Cada autista tem seu espectro, que é bem diferente um do outro. Alguns preferem escrever bilhetes para se comunicar em crise. Outros, não conseguem falar nada, nem escrever. Já eu, percebi que troco palavras e falo frases sem sentido. Costumo usar os antônimos de algumas palavras, e embaralhar a ordem da fala. Na minha cabeça estou falando normal, só percebo quando não entendem nada e me avisam. Também fico evitando a comunicação, sem nem me dar conta. Hoje entendo, que é uma forma involuntária de autodefesa do corpo.
Pra ter ideia, não consegui escrever no WhatsApp para pedir uma receita de
remédio. Fiquei a semana toda adiando e deixei o remédio acabar. E não é que
eu não consiga, eu conseguiria se fosse algo de vida ou morte
(espero que sim, tomara Deus). Mas, internamente sinto que
vai ser muito complicado, e fico evitando ao máximo. É involuntário, vou
procrastinando e não percebo o tempo passar. E não é forma de falar,
literalmente não percebo.
Antigamente, eu me culparia horrores por não resolver algo "simples" (simples para um cérebro típico). O que só pioraria e prolongaria a crise, criando um círculo vicioso. Por isso, cuidado com a forma de pedir ação a um autista em crise. Não deixe ele com a sensação de cobrança, pois já está sobrecarregado com a autocobrança.
Descobrindo Gatilhos de Crise.
Também entendi, porque eu fico sem defesa e sem palavras quando brigam comigo. Já me culpei e sofri muito, por não me defender e permitir abusos. Ainda sinto um pouco de culpa, por não resolver as coisas e me auto sabotar, mas estou melhorando. Por isso, acho tão interessante e importante aprender sobre o Autismo, e me conhecer como Autista.
Estou aprendendo a finalmente me respeitar e exigir respeito.
Meio tarde, mas tudo bem, a gente agradece. Alguns
familiares meus partiram antes de ter a oportunidade de um diagnóstico, então
sou grata. Me considero até um milagre. Pois, fui muito forte e nem sabia o
quanto. Agora sei.
Mesmo que talvez o Burnout e o Shutdown tenham uma explicação espiritual, pra
mim físico e espiritual é tudo uma coisa só. Entender a mente, é
autoconhecimento do mesmo jeito. O importante é a gente respeitar esses
momentos de introspecção. Os Autistas precisam carregar a bateria mais vezes e
tá tudo bem (metade bem). Talvez por sermos mega criativos e
sensitivos, gastamos mais.
Sem querer romantizar, mas já romantizando.
Melhor seria ter o controle do nosso avatarzinho né, mas aqui é a dualidade. Vamos nos empoderando aos poucos, e um dia chegamos lá.
Acredito, que com o autoconhecimento, posso descobrir gatilhos de crise e me cuidar mais. Assim, reduzir essas comorbidades, e ficar sendo só a Camilla doidinha animada. Já percebi, que na maioria das vezes meus gatilhos são ansiedade social, o dia do aluguel chegando, ou boletos vencendo. Mesmo que externamente eu não foque o pensamento no gatilho, a ansiedade trabalha escondida. Com terapia é possível reduzir a ansiedade e evitar o colapso da mente.
Se Aceitar é Importante.
Eu me aceito como autista. Pois foi a cobrança excessiva, e não aceitar minhas diferenças, que me deixou com mais problemas de saúde. Tudo devido a falta de diagnóstico. O autismo nas mulheres é bem diferente. Por isso, muitas sofrem por aí tentando ser normais, fazendo masking social sem saber. Aqui a intenção não é me vitimizar, e sim informar e mostrar que está tudo bem não ser normal. Inclusive, tem uma série coreana maravilha com esse nome na Netflix. Assistam!
Enfim, queria compartilhar com vocês um pouquinho aqui dos meus bastidores e
da minha humanidade. Aí está o paradoxo de uma crise não verbal sendo
verbalizada (gostei, vou usar no título). E agora eu percebendo que estou
saindo dela, pois estão vindo umas frases bem loucas.
Olha só que legal. Não, não foi legal.
Espero que esse artigo anterior, que eu remendei durante o Burnout seja útil pra mim e pra você. Hoje eu reli ele e até que senti mais o que está sendo transmitido ali. A ideia, é ter algo para ler nesses momentos, quando precisamos recordar quem somos. Vou deixar o link dele aqui nessa frase, clica nela e aproveita a leitura!